O grupo Hamas lançou um ataque terrorista contra Israel. Ou não? Na verdade, os assassinos atacaram pessoas que não representam o Estado de Israel. Israel reage bombardeando o Hamas. Certo? Não, o governo do fascista Netanyahu ataca famílias palestinas, mesmo que atinja, aqui e acolá, dirigentes do Hamas.
A brutalidade não é novidade para os palestinos. Vivem em Gaza como quase prisioneiros, humilhados e atacados com frequência. Essas agressões não justificam a ação do Hamas, mas explicam, bem como produziram a vitória eleitoral obtida pelo grupo há mais de dez anos.
Não podemos justificar mortes de inocentes, mesmo com todas as circunstâncias prováveis e possíveis. A banalização do mal, da crueldade, da carnificina é a desumanização radical da nossa existência. Quando essa banalização se assenta em raízes religiosas, isso é ainda mais repugnante.
Impressiona mais ainda quando países ditos civilizados falam em “direito de defesa” quando o ataque terrorista do Hamas é respondido com um bombardeio brutal que atinge milhares de palestinos que nada têm a ver com o Hamas, até porque boa parte são crianças e adolescentes que ainda não tiveram a chance de fazer suas opções políticas. O terrorismo do dia 7 de outubro, que se mantém pelo rapto de duas centenas de israelenses até hoje, não serve de desculpa para o terrorismo de estado contra populações civis e indefesas, á mercê de bombas, fome, sede e medo.
O Hamas, certamente, presumia a reação do governo extremista de Netanyahu. E assumiu as consequências dessa tragédia. De certa forma, fez o jogo do fascista sionista, cujo governo estava em profunda crise. O terror do Hamas deu fôlego para seu decadente governo.
O Hamas se escora nos abusos sofridos, desde o estabelecimento do Estado de Israel em 1948. Ambos os lados têm razões, mas nesse episódio, ninguém tem razão. Israel mantém os palestinos de Gaza em uma verdadeira prisão a céu aberto, fustigando a população, que não tem condições mínimas de sobrevivência. O Hamas chegou ao poder como resposta radicalizada à radicalização do governo de Israel.
Nesse momento, vem à memória a figura de Ihtzac Rabin, primeiro-ministro de Israel, pagou com a vida, morto por um judeu ortodoxo de extrema direita, depois de defender as negociações de paz com a Palestina.
Em meio a essa situação histórica, há uma fábrica de cadáveres operando em três turnos. O Hamas cometeu uma atrocidade e Israel multiplicou a atrocidade, como se isso fosse direito de defesa. É um crime contra a humanidade porque viola os direitos humanos fundamentais, incluindo o direito à vida, à segurança e à proteção das crianças. Ela também viola o direito à moradia, à saúde e à educação. Essas mortes, não importa os argumentos de um ou outro lado, são evitáveis e não têm justificativa.
A dura constatação é que nenhuma guerra tem a honestidade de declarar em alto e bom som: “Eu mato para roubar as terras dos outros ou eu mato para impor meu sistema de crenças e de governança.” Muito pelo contrário, os que movimentam a máquina da guerra invariavelmente invocam os mais nobres motivos como que a legitimar suas matanças: “Eu mato em nome de Deus. Eu mato em nome da paz. Mato em nome da civilização e da democracia”.
Raymond Aron, em seu livro "Paz e Guerra entre as Nações", explora a natureza humana e as causas dos conflitos entre as nações. Ele analisa os fenômenos que levam os povos a guerrear e nos leva a raciocinar sobre dois deveres que nem sempre são compatíveis: um dever com o próprio povo e um dever para com todos os povos, inferindo algo que parece óbvio a todos nós: não ignorar uma história conflituosa e não trair o ideal; pensar e agir com o firme propósito de fazer com que a ausência da guerra se prolongue até o momento em que a paz seja possível.
Sabemos que as armas exigem guerras e as guerras exigem armas, e nos vemos diante de uma contradição paralisante: os cinco países membros permanentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas, aqueles que têm direito de veto nas resoluções da ONU, são também os cinco principais fabricantes de armas do mundo. Afinal, para que serve a ONU? Para que serviu quando os EUA, que apoiam o massacre sobre Gaza, invadiram o Iraque a pretexto da mentira das armas químicas, mas de olho somente no petróleo.
Não é preciso ser um expert em geopolítica ou ter estudos aprofundados sobre o Oriente Médio para perceber que a solução de dois estados é a única maneira de garantir a paz e a segurança entre Israel e a Palestina. Essa solução garantirá o direito dos palestinos a um estado próprio, onde possam exercer sua soberania e autodeterminação. Além disso, também ampliaria as chances de paz, ao criar uma fronteira entre os dois estados.
As palavras de Albert Einstein ressoam profundamente: "A guerra é a maior de todas as doenças humanas". É hora de reconhecermos que a guerra não é a solução, mas sim o problema. É hora de trabalharmos juntos incansavelmente para encontrar um caminho para a paz, onde o sofrimento humano possa ser aliviado e a esperança possa florescer.
Pensem nas crianças, palestinas e israelenses, que não podem escolher entre a paz e a guerra, mas que são vítimas desse terror permanente.
De tanto praticarmos o olho por olho, dente por dente, acabaremos todos cegos e banguelas.
(*) Ricardo Berzoini é ex-Deputado Federal e ex-Presidente do Partido dos Trabalhadores.
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