Este artigo parte de um questionamento básico: Como a sociedade está preparada para, depois de informada, participar e pressionar por ações do seu interesse e, sobretudo, aceitar as consequências das mesmas?
Tendo estes aspectos em foco, em 2003 foi criado, no Espírito Santo, o “Núcleo de Estudos em Percepção Ambiental (NEPA)”, grupo sem fins lucrativos voltado especificamente a avaliar o nível de percepção ambiental e social de segmentos formadores de opinião. Desde então o NEPA (hoje, NEPAS, após inserir a variável social no foco de suas análises) vem consolidando um significativo banco de dados, gerado a partir de pesquisas desenvolvidas. No Brasil e no exterior, junto a segmentos sociais representativos da sociedade, informações que podem ser acessadas através do site www.nepas.com.br
Um exemplo concreto dessa mudança de paradigmas, que contou com o apoio do NEPAS, pode ser visto através da aprovação da Resolução 001/2016 do Conselho Estadual do Meio Ambiente (CONSEMA) do Estado do Espírito Santo, que inseriu os estudos prévios de avaliação da percepção ambiental e social como base para a estruturação de programas de educação ambiental e de comunicação social, a serem apresentados e executados em cumprimento as condicionantes das licenças ambientais emitidas pelos órgãos ambientais.
A referida Resolução, nos seu preâmbulo, enfatiza que além da experiência da consultoria responsável pela proposição de um Programa de Educação Ambiental e de Comunicação Social, também a sociedade, para a qual os programas estão sendo desenvolvidos, deverá ser previamente ouvida de modo a explicitar como esta percebe os contextos ambiental, de recursos hídricos e social da região do entorno onde está inserida.
Prossegue considerando a necessidade que as informações colhidas junto à sociedade devem ser colocadas em discussão pública de modo a promover a interação consultoria / sociedade em ação em atividade que antecipe a posterior estruturação do programa de EA e de CS.
Define ainda a necessidade da proposição de um instrumento prévio que permita o registro da avaliação da percepção ambiental e social da comunidade envolvida, de modo que a consultoria possa usar tais informações quando da proposição / estruturação dos programas.
Complementa considerando que os estudos prévios de avaliação da percepção ambiental e social são de fundamental importância para compreender melhor as inter-relações entre o homem e o ambiente, suas expectativas, anseios, satisfações e insatisfações, julgamentos e condutas.
Explicita o conceito de Percepção Ambiental e Social, definindo como sendo uma tomada de consciência do ambiente e do contexto social pelo homem, ou seja, o ato de perceber o ambiente que se está inserido, aprendendo a proteger e a cuidar do mesmo. Infere que cada indivíduo percebe, reage e responde diferentemente às ações sobre o ambiente em que vive. Ou seja, que as respostas ou manifestações decorrentes são resultado das percepções, dos processos cognitivos, julgamentos e expectativas de cada pessoa. Em síntese, o indivíduo reage no dia-a-dia através de seu nível de percepção ambiental e social.
A Resolução 001/2016 do CONSEMA, em seu Art. 5°, estabelece que os diagnósticos prévios de percepção ambiental e social passam a ser parte integrante do termo de referência do meio socioeconômico apresentado pelo empreendedor para a elaboração do estudo de impacto ambiental – EIA e relatório de impacto ambiental – RIMA, no que concerne a elaboração dos programas de educação ambiental e de comunicação social, além de poder fazer parte dos termos de referência para a estruturação de Planos de Bacias Hidrográficas, bem como da avaliação do nível das decisões tomadas nos comitês de bacias.
Vai mais longe quando, através do seu Art. 6°, determina que os dados coletados através da realização dos diagnósticos prévios de percepção ambiental e social devem ser tabulados por meio de metodologia própria que permita a realização de recortes estatísticos que venham a ser necessários ao aprimoramento das análises, sendo que os dados tabulados devem ser colocados ao conhecimento da comunidade por meio de um evento público, convocado pelo órgão ambiental, especificamente com esta finalidade, promovendo o imprescindível debater com a comunidade.
Enfatiza ainda – fato de significativa importância – que os programas de EA e CS deverão explicitar a correlação entre as ações propostas nos referidos programas e os resultados obtidos decorrentes dos diagnósticos prévios elaborados junto à sociedade envolvida.
As exigências definidas pela Resolução se estendem pelo Art. 8º que explicita que o programa de educação ambiental e o de comunicação social deverão conter como anexo, no mínimo, as seguintes informações: I – instrumento usado na coleta das informações; II – estruturação dos grupos da sociedade que foram pesquisados, III – total de instrumentos aplicados, IV – tabulação dos resultados e respectivos recortes utilizados, V – correlação entre as informações tabuladas e os programas propostos; VI – estruturação dos Programas e a ata da reunião de apresentação dos dados tabulados à comunidade pesquisada.
Para concluir tem-se, via Art. 9º, que caberá ao agente executor a definição de um plano básico de amostragem dos diferentes segmentos da sociedade – lideranças comunitárias, professores, comunidade, órgãos de classe, comunidades tradicionais, entre outros – aos quais deverão ser aplicados o instrumento de avaliação prévia do perfil de percepção ambiental e social. Este programa deve especificar, além dos segmentos a serem amostrados, os quantitativos envolvidos em cada um deles.
Do ponto de vista estatístico, a pesquisa de coleta de informações será do tipo indicadora de tendência.
Como consequência direta e imediata do exposto, fica visível o potencial do instrumento regulamentado na Resolução e a estruturação e/ou a avaliação de Programas de Bacias Hidrográficas, definidos pelas políticas nacional e estaduais de recursos hídricos, bem como, de uma forma objetiva de como poderíamos ir, além dos comitês de bacias, objetivando ampliar a participação da sociedade na discussão da temática dos recurso hídricos.
Não resta nenhuma dúvida que os comitês são os fóruns específicos (legalmente constituídos) onde a sociedade se faz presente (através de entidades eleitas) para discutir e encaminhar posições sobre o uso econômico e social da água.
Entretanto, a nosso ver, os comitês deveriam estender uma consulta (além dos mesmos) para assegurar conhecer como a totalidade da sociedade da bacia hidrográfica “percebe” os problemas hídricos da região, bem a própria ação do comitê e, a partir dai, incorporar este conhecimento às discussões realizadas no âmbito dos comitês.
Para a realização deste tipo de consulta, do ponto de vista normativo, no estado do ES, já contamos com um instrumento para tal, ou seja, a realização de estudos prévios de avaliação da percepção ambiental e social da sociedade da área de influência do comitê de bacia.
Nossa intenção, no âmbito do ES, foi de propor inicialmente uma reflexão aos comitês estaduais de bacias hidrográficas, bem como, em estágio seguinte, levar este tipo de discussão ao plenário do Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERH – ES) e que possivelmente, a proposta possa ser levado a comitês de bacia em outras regiões do Brasil.
*Engenheiro químico, com mestrado em engenharia de produção pela COPPE/ UFRJ e especialização em engenharia ambiental pela Nippon Steel (Japão). Membro titular do Conselho Estadual de Meio Ambiente (CONSEMA) e do Conselho Estadual de Recursos Hídricos (CERH) do Estado do Espírito Santo, bem como idealizador do Núcleo de Estudos em Percepção Ambiental e Social (NEPA).