Por Guilherme Henrique Pereira*
É natural no ambiente de formulação das políticas governamentais a presença de diversos grupos, cada qual mostrando os argumentos que mais atendem aos interesses particulares de cada um. Isso é positivo e contribui para que se tenha a correta avaliação dos muitos problemas e implicações que a intervenção em debate provocará. Isso quando o debate é honesto.
O assustador no presente é a postura deliberada de esconder os verdadeiros objetivos da proposta de política, certamente porque se fossem explicitados não teria o apoio necessário. E é aí que vem a construção das pós-verdades. É preciso divulgar e fazer que as pessoas acreditem na existência de um problema. Não importa se o problema é real. O que interessa é que as pessoas acreditem que ele existe e que requer algumas medidas para ser solucionado. Essas medidas devem atender aos objetivos não confessados explicitamente.
Atualmente o Governo Temer exercita com grande habilidade esse processo de construção das pós-verdades e, assim, vai conseguindo colonizar os votos para se colocar como o governo reformista. O exemplo mais eloquente é o da reforma da previdência que hoje domina o noticiário com o mais notório derrame de mentiras. O argumento principal é de que há um grande déficit e que a única forma de equilibrar as contas é reduzir os benefícios daqueles que dependem da previdência pública. E que se não for feito agora, no futuro não haverá dinheiro para pagar os aposentados.
Há diversos estudos publicados demonstrando que o propalado desequilíbrio vem dos desvios das receitas da seguridade social para outras finalidades. Isso é uma tradição no Brasil e foi praticada, com mais ou menos intensidade, por todos os governos desde Juscelino que tomou emprestado recursos dos institutos de previdência para financiar a construção de Brasília, empréstimos que jamais retornaram. Atualmente sequer há preocupação de tomar emprestado, o saque é direto para a realização de renúncias fiscais em favor de empresas, para beneficiar o setor bancário com o pagamento de elevadas taxas de juros, ou, ainda, por grandes empresas que deixam de recolher e se tornam grandes devedoras. Um saque devidamente legalizado, via leis de renúncias fiscais ou emendas constitucionais estabelecendo desvinculações ou desvios de finalidades de contribuições sociais. Não se pode esquecer dos inúmeros devedores de fortunas à previdência, para os quais os governos fazem cara de paisagem.
A Associação Nacional dos Auditores Fiscais faz um excelente trabalho destacando-se na demonstração efetiva de que o déficit propalado não corresponde à realidade. Veja aqui em Debates em Rede, na categoria sessão de vídeos, sob o título o Mito do Déficit Previdenciário. Se estiver com mais tempo veja também em https://www.youtube.com/watch?v=6jYKSxNaFHY. Além dos vídeos, a ANFIP publicou em sua página vários artigos e estudos sobre este mito. Um visita à página da ANFIP para quem quiser aprofundar-se na desmitificação é altamente recomendada. Veja: http://www.anfip.org.br
Se a proposta atual não é a forma adequada para corrigir os desequilíbrios, por que é necessário fazer tal reforma da previdência?
Esse é ponto mais intrigante do debate sobre esse projeto de mudança constitucional – a PEC 287/2016. Para começar a desvendar esse mistério, é bom lembrar que não se trata da primeira reforma. No Governo Fernando Henrique houve a primeira reforma que já cortou vários benefícios. E agora essa que, na prática, vai tornar ainda pior o sistema público de previdência. Veja aqui no Debates em Rede o vídeo sob o título “O Desastre Com a Sua Aposentadoria”.
Para alguns há um planejamento bem elaborado para que, no médio prazo, todos considerem a Seguridade Social tão ruim que serão obrigados a contratar uma previdência privada. Como os defensores da reforma dizem que não será possível alcançar o ideal com a PEC 287 e já sugerem uma nova rodada para 2019, sobre a qual já se especula que conterá a opção facultativa de contribuir para a previdência pública. Com isso, privatiza-se de vez o sistema. É possível recomendar alguns artigos muito convincentes sobre esse tema. Veja por exemplo:
http://brasildebate.com.br/previdencia-patrimonio-dos-brasileiros-em-xeque/
e também http://brasildebate.com.br/a-reforma-temer-caetano-e-privatizacao/.
* Professor, Doutor em Ciências Econômicas.
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